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A difícil, mas possível, equação da reabertura das escolas

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Por Priscila Cruz e Olavo Nogueira Filho – A pandemia tem demandado discussões complexas e inéditas, mas poucos debates têm sido tão tomados por posições parciais e reducionistas como a reabertura das escolas. De um lado há quem diga que, dado o risco de aumento de contaminações e o receio das famílias, escolas só devem reabrir depois de todos vacinados (a OMS acaba de anunciar previsão de vacinação em massa apenas em 2022). De outro, há a defesa de que o pior já passou e, ante os brutais impactos educacionais e sociais e as limitações do ensino remoto, já demoramos demais para retornar. Dessa disputa deriva o grave impasse observado País afora.

Com efeito, ambas as posições contêm elementos de verdade e, portanto, não é honesto um debate que as desconsidere. Mas como buscar uma saída em prol dos estudantes e que compatibilize posições aparentemente antagônicas?

Primeiro, é preciso dizer que a relutância da população em relação ao retorno, revelada em pesquisas de opinião, é compreensível.

Muitas autoridades públicas, ainda que nem todas, não têm gerado confiança, tanto do ponto de vista do controle da pandemia quanto da segurança sanitária nas escolas. Para piorar, há um crescente movimento oportunista e partidarizado que relativiza o direito das crianças e dos jovens à educação de qualidade, explicitado por variações da frase “não haverá grande prejuízo no retorno só no ano que vem”.

Segundo, há de ser enfatizado que a premissa básica para uma reabertura segura é o controle da pandemia. A preservação de vidas é condição fixa e cabe às autoridades de saúde definir o momento adequado para o retorno em cada região. Em outros países isso tem se mostrado possível quando a pandemia está em declínio e em patamar muito baixo.

O Brasil, porém, fez escolhas ruins que nos colocaram na dramática situação atual: na maior parte do País, seis meses de escolas fechadas até agora, um dos maiores períodos em todo o mundo, consequência do fraco enfrentamento da crise sanitária, negligenciada especialmente pelo governo federal e com quarentenas pouco rigorosas. Além disso, a reabertura maciça de setores menos essenciais – coo bares, shoppings e praias – colabora para manter a pandemia em nível ainda alto em muitos locais. Como não questionar isso?

Diante desse contexto, a saída em benefício dos alunos, em especial dos mais vulneráveis, passa pela mudança na abordagem do problema e por uma ação governamental muito mais vigorosa.

Em vez de seguirmos no embate inócuo entre a reabertura das escolas ou não– novamente, assunto da saúde –, o foco deve estar em como se prepararem para reabrir assim que for seguro. Nesse sentido, a decisão de alguns prefeitos e governadores, faltando ainda quatro meses para o fim do ano, de jogar a discussão para o ano que vem é precisamente o que não deve ser feito. Isso porque em algumas dessas regiões o estágio da pandemia pode permitir o retorno ainda este ano.

Além disso, o simples anúncio de retorno só em 2021 enfraquece o senso de urgência das inúmeras providências necessárias para a eventual reabertura das escolas. No âmbito municipal, a consequência é ainda mais grave: com eleições à porta, e uma média histórica em que pouco mais da metade dos prefeitos se reelegem e 80% de secretários de Educação são substituídos, teremos um enorme contingente de municípios com novas gestões assumindo em janeiro e que, naturalmente, precisarão de tempo para se organizar. Chegaremos a 12 meses com escolas fechadas em locais onde a reabertura segura poderia ter sido antes?

Não obstante a ausência de diretrizes e apoio do Ministério da Educação, alguns governantes não se renderam ao caminho fácil. Mesmo diante dos riscos políticos, preparam-se para reabrir assim que for possível (em alguns locais a retomada já foi iniciada). Atuam para garantir condições físicas e sanitárias nas escolas e planejam a desafiadora resposta educacional: ações intersetoriais de combate à evasão, protocolos pedagógicos e de acolhimento, revisão do calendário escolar, formação dos profissionais da educação, avaliação diagnóstica dos alunos e programas de recuperação – para citar as principais.

Além disso, são lideranças que usam a comunicação e o diálogo como instrumentos de gestão, engajamento e pactuação. Vale observarmos as experiências de Rondônia, Goiás e Mato Grosso do Sul com os Gabinetes de Articulação para o Enfrentamento dos Efeitos da Pandemia na Educação (Gaepes), que definem ações coordenadas envolvendo Executivo, Legislativo, sistema de Justiça e representações dos professores e famílias. Na esfera municipal há também esforços similares, como em Londrina (PR), com o Comitê de Estudo para a Retomada das Aulas Presenciais. É, sem dúvida, muito mais trabalhoso, mas tal estratégia facilita a construção de soluções sistêmicas, consistentes e mobilizadoras. Aumentam-se, assim, as chances de resultados promissores para reabertura das escolas.

Para o observador atento, que desconfia das soluções fáceis, há caminhos, embora exijam compromisso diligente. Ainda dá tempo de reagir, mas não muito. As decisões tomadas em 2020 vão ecoar por muitos anos.

Priscila Cruz é co-fundadora e presidente-executiva do Todos Pela Educação; Olavo Nogueira Filho é diretor-executivo do Todos Pela Educação.

Artigo publicado originalmente no jornal O Estado de S. Paulo no dia 18 de setembro de 2020.