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Vida entre escolas

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Amor e luta. Essa é a dupla que, na opinião de Clênia Cristine de Pontes Lima, 33 anos, professora das escolas de língua portuguesa em Itambé (PE), explica a carreira do profissional que forma todos os demais. “Se hoje um jovem me perguntasse sobre como é ser professor eu diria que é lutar pelos seus direitos, mas também amar o que faz. Sabemos que a imagem desse profissional está muito desgastada; as pessoas pensam que apenas os perdedores vão para a Educação, porque não conseguiram fazer outra coisa”, critica a docente que dá aulas para o Ensino Médio no período integral na rede estadual de Pernambuco e na rede estadual da Paraíba.

Educadora há 15 anos, ela avalia que a situação dos professores vem melhorando ao longo dos anos – no entanto, essa melhora ainda não é suficiente para garantir boas condições de trabalho. Clênia, que cumpre uma carga horária semanal de 60 horas, destaca que o magistério ainda é uma carreira em que se trabalha mais e se ganha menos que os profissionais com o mesmo nível de formação. “Como o salário ainda não é nem o suficiente nem o justo, precisamos trabalhar em mais de uma escola para complementar a renda. Eu mesma trabalho em duas escolas”, conta.

professora das escolas

A professora Clênia dá aulas em Educação Integral e também à noite. 

Diante de uma carga profissional pesada, a vida pessoal fica espremida no tempo que sobra entre uma escola e outra. “A Clênia fora da sala de aula praticamente não existe. Como passo o dia no modelo integral e ainda dou aulas à noite, acabo dedicando pouco tempo  à minha família”, pondera.

A sobrecarga de trabalho que, inclusive, impacta a saúde de muitos educadores, também é uma questão para Márcio Fernando Nunes Carvalho, professor de geografia em escolas de Santo André e Rio Grande da Serra, municípios da grande São Paulo. “Na verdade, eu faço uma tripla jornada, trabalho em duas escolas e ainda ‘faço uber’ para cobrir as despesas com o deslocamento entre as unidades escolares. O dinheiro que gastaria apenas comigo, recupero ao pegar um ou outro passageiro”.

Assim como ocorre com Clênia, as múltiplas jornadas de trabalho acabam impactando a vida social de Márcio. “Antes eu até conseguia terminar a parte burocrática de preencher papéis na escola mas, hoje, nem isso eu consigo. Trago os diários de sala de aula para casa”, conta o docente, que dá aulas para turmas do Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA).

+++”PREGO A QUALIDADE DE VIDA, MAS NA MINHA PRÓPRIA ROTINA É MUITO DIFÍCIL SEGUIR”, DIZ PROFESSORA

Com nove anos de carreira, Márcio acredita que a falta de tempo combinada à burocracia  impossibilita o preparo de aulas mais interessantes e de um ensino mais significativo. “Se quisermos fazer qualquer coisa fora da sala de aula é muito difícil. Imagine para mim como é dar aula de geografia preso dentro de quatro paredes. Ensinar sobre os ciclos das rochas, por exemplo, exigiria uma saída, nem que fosse uma voltinha no bairro. Além disso, mesmo que eu pudesse propor algo diferente, a sobrecarga me obriga a levar trabalho para casa e falta tempo para um preparo adequado”.

professor da escolas

O professor Márcio trabalha em duas escolas e também é motorista de Uber.

Os percalços podem dificultar a execução das atividades e as condições de trabalho nas salas de aula mas, mesmo assim, Márcio gosta de ser professor, especialmente da EJA. “Lá eu me sinto realmente professor, consigo expor meu método de ensino, porque os alunos ali voltaram à escola por sentirem falta dos estudos”, conta ele.

A 2,8 mil quilômetros de distância de Márcio, no interior de Pernambuco, Clênia partilha de sentimento semelhante. “Eu me considero uma profissional de sucesso. A leitura me fez querer ser professora e agora tento ser um espelho para meus alunos. Eles me dizem coisas como: ‘Professora, quando a gente lê, sente uma coisa diferente’”, conta ela. “Isso acontece porque eu me emociono e quero que eles também se emocionem. Se eu puder mostrar que a Educação pode mudar a vida deles, já estarei satisfeita”, conclui Clênia.


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