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Escola que forma para a vida, forma para a Política

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Ao andar de ônibus, cruzar a rua, parar em um semáforo, sentar em uma praça, comprar uma casa ou realizar tantos outros atos corriqueiros, estamos fazendo política. Não a política de entrega de santinhos e discursos em palanques, mas aquela relativa ao uso do espaço, acesso a direitos e cumprimento de deveres. A política em que se toma decisões diária está em todo lugar.

Apesar de sermos “cercados” por política, quando a Escola Técnica Estadual (ETEC) Pirituba começou a oferecer um curso de iniciação política, a diretora Eliane Leite ouviu logo: “Tome cuidado com o que você vai falar!”. Contrariando a velha ideia de que “política não se discute”, a escola localizada na região norte de São Paulo promoveu no último mês de setembro – em pleno período de campanha eleitoral – um curso sobre cidadania.

A iniciativa surgiu a partir da participação do professor e cientista político Humberto Dantas na “Semana Vocacional”, que acontece anualmente no colégio. O evento procura ampliar o leque de referências dos estudantes com palestras de diferentes profissionais. Diante do bom retorno da comunidade sobre a palestra de cidadania e do engajamento dos estudantes, a unidade abriu vagas para as aulas de Educação Política, do qual participaram 35 alunos.

“O jovem no Brasil nunca é levado a sério”

Contrariando o óbvio, em um curso de Educação Política não é só o professor que fala. Na ETEC Pirituba, as atividades só tiveram início após um questionário sobre a percepção política dos jovens, onde eles expuseram a importância da democracia, a legitimidade das manifestações de rua e a necessidade desse debate estar no currículo escolar. “Não os convenci disso, eles já reconheciam. As falas espontâneas mostraram que os estudantes têm uma percepção política que foge ao senso comum sobre eles. Os jovens querem conhecer e se aprofundar na política”, analisa Dantas.

Mas ele reconhece que muitos jovens ainda se sentem distantes e descrentes em relação ao tema. “Se não fizermos nada, eles vão se tornar tão amargurados quanto à população mais velha. Se começarmos a educar, quem sabe eles se apropriem e se aproximem dos instrumentos formais de transformação”, propõe Dantas.

Formação

A Constituição Federal de 1988 indica que a Educação é um direito social que deve garantir o pleno desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania. Saber fazer escolhas críticas para o bem coletivo, portanto, faz parte de um ensino de qualidade. Esse princípio não impede, contudo, que haja resistência à discussão política na escola. Dantas não apenas discorda dessa aversão, como ressalta que a intransigência com o assunto remete a regimes autoritários. “Na democracia, política se discute, sim. O grande problema não é a política, mas a forma com que a fazemos”, explica ele.

De acordo com o cientista político, há uma distinção clara entre “doutrinação” e Educação Política que precisa ser ressaltada. A primeira é feita pelos partidos políticos que capacitam pessoas que deles se aproximam. Já a Educação Política tem como elemento principal respeitar a diversidade ideológica e transmitir às pessoas o que significa viver em uma democracia e com as diferenças de pensamento. “Educar politicamente uma pessoa é fazer com que ela perceba como funcionam as estruturas políticas do País. A partir disso, permitir que o cidadão crie suas próprias posições e, se assim o desejar, ser ‘doutrinado’ por este ou aquele partido de sua escolha”, pondera Dantas.

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Discordar é saudável

Na ETEC de Pirituba, os encontros seguiram o caminho da Educação Política e focaram em temas importantes, como democracia e ética, cidadania e políticas públicas, estrutura do Estado e participação. Além disso, nas atividades práticas, os jovens podiam opinar e se manifestar sobre os conceitos apresentados.

A diretora Eliane confirma os aspectos positivos da iniciativa. “O curso demonstra a importância da responsabilidade cidadã, ajuda os estudantes a pensar como farão as suas vozes serem ouvidas e como construir espaços de diálogo”, observa.

Diante da experiência bem-sucedida nesta e em várias outras escolas da periferia da Grande São Paulo por onde passou, Dantas rejeita a tese de que os alunos sejam passivos e aceitem sem ponderação a tudo que dizem os professores e os adultos. “Eles são ativos, extremamente questionadores e debatem as ideias que os professores apresentam”, afirma. Ele ainda reitera a importância pedagógica da divergência. “Os conflitos de ideias são saudáveis em sala de aula”.

Para ele, diferentemente do que presenciamos nas eleições atuais, debates respeitosos e de qualidade podem surgir a partir da inserção da Educação Política no currículo escolar. “Não é possível que a política seja assunto apenas dentro de casa, porque muitas famílias não têm capacidade técnica para fornecer uma boa formação e nem foram educadas para isso. A política não pode faltar na escola”.

A diretora Eliane concorda com a opinião de Dantas e faz questão de espalhar o espírito democrático e crítico dos estudantes, incentivando os jovens a pensar soluções para problemas da comunidade ao redor. “Tivemos ocupação aqui em 2016 (pela merenda das escolas técnicas) e, à época, eu disse que não adiantaria pedir por merenda e deixar tudo no prato depois de recebê-la. Eles também precisam entender que um País melhor requer responsabilidade individual. Isso começa quando cuidamos da nossa escola como um espaço coletivo”, explica ela.

As discussões tiveram efeito no comportamento dos estudantes – e não foi apenas Eliane que notou a diferença nos jovens. A professora responsável pela Parceria empresa-escola, Maria Inês Rodrigues também. “Percebi que eles se sentiram valorizados e entenderam que têm uma voz”, explica.

Os pais também receberam bem a iniciativa. “A comunidade aceitou bem a iniciativa ao ver que o aluno percebe a importância do coletivo, da escuta e consegue construir consensos”, afirma a diretora Eliane.