Ensino Médio: o que querem os jovens?
Os jovens estudantes do Ensino Médio estão atentos aos valores transmitidos pelas escolas brasileiras e à atuação docente. Para eles, a escola ideal se preocupa com a inclusão e assegura o mínimo de infraestrutura para garantir uma Educação de qualidade. É o que revela a pesquisa Repensar o Ensino Médio, iniciativa do Todos Pela Educação, que contou com apoio do Itaú BBA e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com realização da Multifocus. O estudo – que ouviu a opinião de 1551 jovens entre 15 e 19 anos sobre os professores, a participação social e a Educação Técnica – dá pistas sobre o que deve estar no radar de gestores, educadores e especialistas em relação às políticas públicas educacionais voltadas para a juventude.
Na percepção dos jovens entrevistados entre setembro e outubro de 2016, segurança, atenção às pessoas com deficiência, professores assíduos e boa infraestrutura são, ao mesmo tempo, os itens de maior importância e menor satisfação em relação a suas escolas.
Mas os motivos de incômodo não se restringem aos atributos externos. Os estudantes também apontam o próprio comprometimento e comportamento nas aulas como algo de alta relevância e baixa satisfação em relação à escola, indicando que entendem a Educação como um compromisso de todos da comunidade escolar.
Os conteúdos curriculares e a maneira como eles são ensinados também surgiram como temáticas relevantes para os jovens. Eles estão pouco satisfeitos, por exemplo, com as aulas de Língua Inglesa e o uso da tecnologia em sala de aula, o que pode indicar fragilidades no currículo e na formação dos professores de língua estrangeira, bem como a falta de uma preparação docente para a sala de aula que contemple a inserção de dispositivos eletrônicos como ferramentas de aprendizagem.
Ensino Médio para quê?
Com baixas taxas de conclusão e aprendizagem, o Ensino Médio é um desafio para os gestores públicos e o modelo tem, ao longo dos anos, dado sinais de esgotamento e incompatibilidade com o que os jovens estudantes querem ou esperam.
Nesse sentido, compreender os objetivos da etapa sob a perspectiva dos alunos é essencial. Os entrevistados declararam ansiar pela continuidade dos estudos no nível superior e esperam que a última etapa da Educação Básica os prepare para essa finalidade. De acordo com a maioria dos jovens entrevistados que está cursando o Ensino Médio (71,4%) a principal motivação para cursar a etapa é estar preparado para o vestibular.
Para os jovens, portanto, o significado da etapa está mais atrelado à passagem para a Educação Superior do que à formação para a vida (10,2%) ou ao preparo básico para o mundo do trabalho (16,6%).
Esse fato pode ter consequências negativas quando, apesar da intenção, muitos não conseguem seguir o caminho desejado, pois 86% alegam ter alguma dificuldade para continuar estudando, sendo que 42% afirmam ter obstáculos financeiros e 19% problemas em conciliar trabalho e estudos.
O que significa Educação Técnica para o jovem?
Ainda que a maioria dos jovens entenda o Ensino Médio como uma ponte para a Educação Superior, grande parte deles vê com importância uma formação básica que prepare para a vida profissional – 77,6% dos estudantes atribuem grau de importância 9 ou 10 para matérias dirigidas à formação profissional, técnica e aconselhamento.
Além disso, 76,5% dos estudantes aprovariam a substituição de um terço das matérias do Ensino Médio por disciplinas técnicas a escolha do estudante, caso a carga horária diária da etapa fosse de 5 horas. A aceitação é maior na região Nordeste (85,5%), e menor na região Sul (44,6%).
Contudo, apesar do expressivo assentimento, metade dos alunos do Ensino Médio Regular ou da Educação de Jovens e Adultos (EJA) diz não conhecer nenhuma modalidade de Educação Técnica. O recorte por classe revela ainda que a Classe DE é a que mais desconhece a modalidade.
Isto é, embora haja interesse pela expansão do ensino técnico profissionalizante, falta de um lado um trabalho de comunicação eficaz que possibilite que as informações sobre a Educação profissional como trajetória formativa cheguem aos jovens – 95% dos estudantes gostariam de saber mais sobre essa modalidade de ensino – e do outro, a ampliação da oferta de forma que seja mais acessível. Dentre os estudantes Ensino Médio Regular ou do EJA, há alta concordância de que o desestímulo para cursar o ensino técnico se deve ao processo seletivo ser muito concorrido (42,2%) e à falta de acessibilidade geográfica (39,6%).
O que os jovens esperam dos professores?
Tal qual na questão da formação profissional e técnica, os apontamentos da juventude são centrais para repensar outros aspectos estruturais do Ensino Médio, como a formação inicial e continuada dos professores. A relação entre docentes e alunos e a visão que os jovens nutrem sobre o magistério são determinantes para a qualidade da Educação do País no presente e no futuro.
De acordo com a pesquisa, os estudantes do Ensino Médio consideram como atributos importantes que os professores demonstrem paixão pela profissão, que não desistam diante das dificuldades dos alunos e que cobrem comprometimento dos alunos. Relevantes também foram apontados o foco na preparação para vestibulares, o estímulo à curiosidade dos alunos e os exemplos práticos aplicados ao dia a dia, como se pode observar no gráfico abaixo.
A pesquisa também investigou o interesse dos jovens na carreira docente. Embora 38% dos jovens já tenham pensado em ser professor, 23% disseram ter desistido da ideia. O grupo que pretende seguir a carreira é relativamente maior na classe DE (16,6%), justamente o grupo que requer mais apoio à permanência na universidade.
Diante desse importante potencial de futuros professores, que poderiam amenizar a falta crônica de docentes no Brasil em algumas disciplinas, compreender a desistência é fundamental. Os principais motivos associados à rejeição da profissão refletem aspectos relacionados à baixa valorização que a sociedade brasileira atribui aos professores. De acordo com os entrevistados, o pouco respeito dos alunos (20,9%), o baixo salário inicial (17,7%) e o pouco reconhecimento da sociedade (14,2%) fazem com que a carreira não seja uma opção.
Participação Social
Além de escutar os jovens sobre as condições de ensino, a pesquisa também procurou compreender a maneira como a juventude tem se engajado: 43% dos jovens entrevistados afirmaram ter participado de algum movimento social no último ano, sendo que 8% deles participaram de três ou mais tipos de movimentos, entre as opções estimuladas estavam: manifestação pública, abaixo-assinado, greve, debates, atividades em grupos religiosos e voluntariado.
Esse potencial de engajamento dos alunos é relevante para o fortalecimento das instituições democráticas da escola e para que novos mecanismos de participação sejam criados, tema, por exemplo, das estratégias 19.4 e 19.6 do Plano Nacional de Educação (PNE).
Mais diálogo
Os resultados da pesquisa indicam que repensar o Ensino Médio não pode ser uma ação dissociada do diálogo com a juventude, que é usuária e potencializadora dos investimentos da etapa.
Não há, entretanto, uma total divergência entre os anseios dos jovens e as propostas de políticas públicas em andamento. A Base Comum Curricular do Ensino Médio e a flexibilização da etapa proposta pela Lei nº 13.415/2017 (Medida Provisória 746) são, respectivamente, oportunidades de revisão do currículo e de abertura de novas perspectivas para estudantes concluintes do Ensino Médio. Contudo, os alunos indicam que uma completa reformulação da etapa requer mudanças em aspectos básicos da Educação (e que não foram contemplados pela Lei), como mudanças na formação e atuação docente, expansão e adaptação da infraestrutura das escolas e mais segurança.
Esse panorama sugere, portanto, uma necessária combinação de diferentes políticas capazes de solucionar os diversos problemas relacionados ao Ensino Médio. Uma articulação de iniciativas que leve em consideração semelhanças e disparidades culturais de todo País e entre os diferentes perfis de estudantes, pois uma única solução pode não responder à diversidade.
A categoria segurança, por exemplo, é apontada como o item mais relevante da escola por alunos da rede pública de todas as regiões. No entanto, nas regiões Sudeste, Norte e Sul, a atenção às pessoas com deficiência ganha destaque; no Nordeste, professores assíduos são o que mais preocupam os estudantes e no Centro-oeste, a cordialidade dos funcionários.
Metodologia: Como foi feita a Pesquisa Repensar o Ensino Médio?
A pesquisa foi realizada em duas etapas: uma qualitativa e uma quantitativa. A pesquisa quantitativa teve caráter amostral e contou com 1551 entrevistados que representam os 17 milhões de jovens do Brasil na faixa etária de 15 a 19 anos, de acordo com a distribuição dessa população nas regiões, entre os sexos, classes sociais, capital/não capital, escola pública/privada.
Já a fase qualitativa contou com a participação presencial de 377 jovens em grupos focais realizados nas cidades de São Paulo (SP), Jacareí (SP), Florianópolis (SC), Itajaí (SC), Fortaleza (CE), Itapipoca (CE), Belém (PA) e Bragança (PA). A interação desses jovens em mesas redondas, exercícios criativos em grupo e perguntas individuais foram as técnicas utilizadas para formular o questionário-base, para a etapa quantitativa.
A margem de erro da pesquisa é de 2,5 pontos percentuais nos cruzamentos que reúnem toda a amostra.
– Análise dos dados das questões de avaliação de atributos
Em algumas questões, os entrevistados tiveram de associar uma nota de 0 a 10 para a importância e a satisfação que eles atribuem a cada um dos elementos apresentados. Com isso, foi possível compor os índices de relevância e satisfação a partir do percentual de alunos que atribuíram notas 9 e 10 (critério top 2 box) a determinado item. Já para compor os índices de menor satisfação em relação determinados itens, foram observados o percentual de notas dadas de 0 a 5 (critério top 6 box) pelos respondentes.