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Como Educação de qualidade se torna qualidade de vida: o exemplo de Medellín

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Que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, não é segredo para ninguém. O acesso a serviços básicos, educação de qualidade e ao conhecimento, de modo geral, é muito mais difícil para aqueles que vivem em regiões mais vulneráveis – especialmente onde a violência é parte do cotidiano –  como os jovens negros das comunidades do Rio de Janeiro. Ao largar bem atrás na “corrida” pela conquista de uma vida digna e cidadã, como esses e os outros habitantes de cidades semelhantes podem vencer barreiras sociais, culturais e econômicas?

A resposta para esta pergunta é bastante complexa, mas certamente passa por Educação de qualidade para todas as crianças e jovens. E foi exatamente sobre isso que o debate intitulado “Onde nascem os fortes” discutiu durante o evento internacional Educação 360, realizado no Rio de Janeiro. O encontro é uma iniciativa dos jornais O Globo e Extra e conta com apoio do Todos Pela Educação.

Para inspirar a realidade brasileira e mostrar que é possível romper este ciclo de desigualdades, a organização trouxe Jorge Melguizo, ex-secretário de Cultura da cidade de Medellín, na Colômbia, que por décadas,manteve a fama de corrupta, violenta e polo do crime organizado, especialmente do tráfico de drogas. Hoje é uma das cidades que mais crescem em qualidade de vida e turismo no país latino, além de ser reconhecida por prêmios internacionais pelo seu esforço de transformação. “Em cerca de 18 anos, conseguimos fazer a mudança e hoje, um pobre de Medellín é menos pobre do que o pobre de qualquer outro lugar da América Latina. Isso acontece porque ele tem acesso à Educação, transporte, esporte, recreação, todos os serviços públicos”, explicou Melguizo.

De acordo com ele, as regiões mais carentes da cidade colombiana são 100% asfaltadas e contam com energia elétrica e saneamento básico. “Ainda somos uma cidade dramática, onde se perdem vidas, mas melhoramos consideravelmente com o investimento orientado para Educação e cultura”, pontuou.

Segundo ele, é esse tipo de política pública que faz a diferença na vida das populações vulneráveis, e não as chamadas “jornadas de pacificação”. “Esse tipo de ação não serve para nada, somente cria horror. Quando a única presença do Estado em uma comunidade é a polícia, estamos criminalizando essa comunidade”, esclareceu Melguizo.

A implantação de uma mudança como a de Medellín passa, segundo ele, por questionamentos tais quais: Nosso sistema de Educação lê o jovem e o território? Que tipo de sistema queremos para esses jovens? Ou seja: os projetos de Educação de Qualidade dos nossos países conseguem ser igualitários e equitativos?. “A Educação não é suficiente para superarmos toda a desigualdade, mas transformá-la é o grande desafio ético da América Latina”, afirmou.

Inspiração

Baseado na experiência de Medellín, a prefeitura de Recife criou o Centro Comunitário da Paz, conhecido apenas como Compaz, cujas unidades localizam-se em regiões bastante vulneráveis da capital pernambucana.

O Compaz é um projeto de cultura cidadã que consiste em prédios que funcionam como articuladores de serviços diversos para a população, como: reforço escolar na educação de qualidade, artes marciais, balé, música, street dance, robótica, circo, beisebol, skate, futebol americano, ginástica, capacitação profissional, palestras e campanhas de vacinação. A infraestrutura conta com biblioteca, auditório e ginásio, além de outros equipamentos.

Para oferecer tudo isso, o Compaz envolve atividades de nove secretarias municipais, mas a sua gestão fica a cargo da secretaria de Segurança de Recife. “Quando assumimos esse compromisso, não sabíamos o que fazer, mas sabíamos o que não fazer, que é reproduzir repressão nas comunidades. O Estado precisa estar presente na vida do cidadão e o equipamento precisa ter escala no território, caso contrário, vira apenas um cartão-postal”, explicou Murilo Cavalcanti, secretário municipal de Segurança de Recife e um dos idealizadores do projeto.

Segundo ele, a inspiração nasceu justamente da experiência de Medellín. “O Compaz consiste em oferecer os melhores serviços para a população mais pobre”.

Inclusão

Jailson de Souza e Silva, fundador do Observatório das Favelas do Rio de Janeiro, trouxe para o debate uma contribuição fundamental: a visão de quem vive nas comunidades cariocas e precisa superar diversas barreiras sociais para conseguir progredir na escolaridade.

Para ele, é preciso combater elementos que regulam as desigualdades sociais brasileiras, como o racismo, o sexismo e patrimonialismo. “A escola deve promover o desenvolvimento das habilidades cognitivas – só ela pode fazer isso pela criança pobre. Além disso, é ela quem vai dar a esses alunos e alunas as noções de ética e convivência, e dimensão estética”, concluiu.