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Ser professor muda tudo – inclusive o País

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Profissionais que sentem orgulho do que fazem, com uma trajetória na Educação Básica de alta performance, formação rigorosa e que estão sempre estudando. Essa é, para muitos, a descrição do profissional médico no Brasil. Mas, em outros países, é o professor essa figura!

Mais que uma discussão sobre carreiras, restrita a uma categoria, ser professor é assunto nacional. É ele o líder da Educação capaz de despertar soluções para os reveses sociais, gerando desenvolvimento individual e coletivo. Apesar dessa dinamicidade, do propósito e da complexidade da função, a carreira docente está marcada pelo baixo status social, última opção para muitos. Ao mesmo tempo, é consenso entre os especialistas que sem esse profissional não teremos vigor competitivo nem criatividade produtiva. Então, por que ainda estamos parados?

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De olho no futuro do País, o Todos entrou nesse debate em 2017 e colocou entre os sete pilares para o Brasil dar um salto em Educação: a profissão do professor. Fundamentado em estudos, análises de sistemas de ensino bem-sucedidos, pesquisas de opinião com professores e debates com especialistas da área, o Todos indicou, na agenda EducaçãoJá!, três prioridades para mudar a carreira: melhoria nos cursos de formação inicial, com ênfase na prática pedagógica (o que envolve garantir referências pedagógicas aos docentes, melhor regulação e avaliação do MEC das faculdades particulares formadoras, uso estratégico e limitado da Educação a Distância EAD); seleção mais criteriosa, com uma nota mínima para entrar nos cursos de formação e valorização (com a estruturação de uma carreira que estimule o desenvolvimento e boas condições de trabalho).

Somando mais de 60 anos dedicados à Educação, três educadoras comentam esses três pilares.

1. Formação ancorada na prática

Recepcionados por eles às portas das salas de aula diariamente, pouco ou quase nada sabem outros profissionais da formação do professor. Com que ferramentas eles dão suporte socioemocional a 40 alunos enquanto despertam a sede por aprendizado? O que se chama de maneira sintética de formação inicial e continuada são anos de estudos teóricos, para dominar os conteúdos das disciplinas e fundamentos da Educação, combinados à prática, metodologias de ensino, e aprendizagem constante de temáticas que dialogam com a contemporaneidade. Por isso, o Todos defende um preparo docente que coloque a teoria a serviço da prática. A professora Marta Belo, 57, também. Professora alfabetizadora na escola Ueb Ensino Fundamental Prof Rubem Teixeira Goulart, em São Luís (MA), Marta acredita que ensinar o encantamento das letras passa por entender essa dualidade na formação. “Para alguns professores, alfabetizar é só teoria e, para outros, é repetir as mesmas coisas em sala de aula por trezentos anos, sem nunca estudar. Não é nem um, nem outro. É ambos: técnica e estudo”, disse. Ela acrescenta ainda que o educador precisa olhar o aluno como um ser integral. “É preciso entender que educar não é uma caixa compartimentada, onde cada coisa está numa gavetinha. Além disso, o professor precisa estar sempre se atualizando, procurando informação: não dá para estimular o que não faz”.

Outro aspecto central para aprimorar a formação é melhorar a avaliação dos cursos formadores, impedindo que cursos curtos e de má qualidade proliferem. Cláudia Costa, 55, diretora-adjunta do Colégio Estadual Chico Anysio e professora de física critica esse tipo de formação. “Há complementações pedagógicas para profissionais de outra área que resolvem ser professores com duração de um ano aos sábados! Como esse profissional está preparado para dar aula? Será que dar aula é só saber quimíca?”, questiona. Ela também problematiza a formação docente a distância. “Há lugares em que esse meio é importante, que é possível democratizar o preparo. Mas é preciso muito cuidado. Afinal, ninguém forma médico a distância”, critica.

2. Uma profissão que não é para qualquer um

E compromisso com a carreira é algo que não se limita à avaliação dos cursos, está ligado também ao perfil de jovens atraídos para a área. Um estudo realizado pelo Todos mostrou que esse é um problema grave no Brasil: em que grande parte dos estudantes que entram em cursos de formação de professores têm baixa performance.

“Está muito banalizada a formação do professor. Da mesma forma que exigimos seriedade dos médicos, por que não exigir dos professores? Se o médico der um remédio errado ao paciente, ele o mata. Se eu, professora, não for preparada para trabalhar bem com meus alunos da Educação Infantil, Fundamental e Médio, também estarei matando a construção de um projeto de vida. Por isso seria interessante haver uma avaliação dos professores ao final do curso”, diz. 

Além do desempenho acadêmico, é também parte da profissão ter compromisso com um propósito com o ato de aprender a ensinar, um alerta feito pela professora Marta. “Ser professor não é para todo mundo não. Tem que ter muita consciência de seu papel de educador e cidadão, e cuidado com o ensinar. Tem que ter esse olhar responsável”, disse.

3. Carreira valorizada

Formação e seleção sozinhos não funcionam, é o que indicam as pesquisas. Marta também relativiza o impacto do rigor na seleção dos futuros professores, destacando a nulidade da inciativa frente à falta de valorização financeira. “Valorizar a carreira por meio de condições de trabalho adequadas e financeiramente atrairia esse aluno que tem vontade de ser professor, mas que não vai porque o advogado ganha melhor ou porque o médico tem mais status”, pondera.

Mariana Barros, 48, professora de Educação Física, nas escolas EMEF Mariana Leão Dias e na EEEM Dep. Raimundo Ribeiro de Souza, em Tucuruí (PA), também destaca a impossibilidade de um professor, mesmo que bom e bem preparado, executar bem o ensino em um ambiente desfavorável. “A quadra é minha sala de aula, muitos profissionais não têm esse espaço. Nós, professores de Educação Física, temos grandes desafios educacionais a cumprir: despertar o gosto pela atividade física, tornar o aluno mais ativo, torná-lo um ser reflexivo, sociável. Sem espaço físico dá trabalhar tudo isso? Pode até dar, mas com recursos daria para trabalhar direito”, enfatiza.

Construir uma carreira valorizada requer olhar para os demais profissionais que atuam ao lado e em apoio ao professor é o que Mariana pontua. “no início da minha carreira eu sentia muita falta do suporte pedagógico. Só formar o professor e colocar em sala de aula, não é suficiente. A verdade é que professor sozinho não faz Educação, precisa de recursos humanos materiais e pedagógicos”.

ERA UMA VEZ UMA JOVEM PROFESSORA...

As três educadoras integram a Rede Conectando Saberes, da Fundação Lemann, que tem como principal característica a troca de saberes e aprendizagens entre os professores. E já que os conselhos fazem parte desse compartilhamento, elas contaram ao Todos que conselho dariam às suas versões mais novas e iniciantes na carreira. Confira o que elas enviaram caso existisse uma cápsula do tempo:

Marta - 27 anos como educadora

“Tenha mais paciência. Quando for ficando mais velha, você aprenderá melhor como contornar as situações com os jovens, com a aprendizagem. Então, respire. Além disso, eu diria estudo mais! Sempre mais.”

Cláudia - 29 anos como educadora

“Se eu pudesse dizer algo a mim mesma no início da carreira, diria: não desista. É difícil, mas será gratificante quando perceber que você é fundamental para levar seu aluno a ser o que quiser e onde quiser, especialmente aqueles com menores oportunidades.”

Mariana - 24 anos como educadora

“Ter foco no que vai fazer e não desanimar diante das dificuldades. Seja uma uma eterna estudante. Quando o professor estuda, ele tem segurança onde quer que esteja. Ser educador é ter compromisso com o ensinar e para isso é preciso estar embasado.”